sábado, 5 de julho de 2014

O Mais Importante é o Amor



Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade (amor), estes três, mas o maior destes é o amor.

                                         (I Co 13:13-RC)




            Neilson acordou, naquela manhã, decidido a colocar em prática sua nova proposta de vida: sair de casa ou da Fazenda de seu pai para conhecer os prazeres da vida, na cidade. Não queria mais para si aquela vidinha pacata do meio rural. Ele desejava experimentar fortes emoções e usufruir da grana e de sua juventude. Durante todo aquele dia, insistiu com o seu pai para que este lhe desse a sua parte na herança da Fazenda. O pai, amoroso e cuidadoso, tentava mostrar para o jovem o quanto era perigoso para ele “cair” no mundão sem rumo e sem preparo. Procurou transmitir ao filho a segurança que havia em casa e as possibilidades que ele tinha de constituir uma família com o futuro já garantido. Usou a Bíblia para mostrar o perigo de estar fora da casa do Pai, pois Neilson não estava apenas querendo sair de casa, ele estava também disposto a largar a sua fé.

            Porém, o jovem estava decidido. Depois de muito conversarem e do pai insistir para que ele não partisse, o velho, vendo que não conseguia mudá-lo de atitude, decidiu, embora com tristeza, realizar o desejo de seu filho e lhe deu a sua parte na herança. Tão logo tomou posse do dinheiro, o rapaz pegou seu carro com algumas roupas e foi para a gandaia, aloprou de vez!

         O irmão mais velho, Otávio, soube dos fatos após chegar do trabalho de uma das lavouras da família e achou um absurdo o ocorrido. Ele não aceitava o fato do pai entregar a parte de seus bens para o irmão gastar com bebidas, mulheres e farras. Porém, “era o direito dele”, argumentava o pai. Aborrecido, decidiu esquecer que seu irmão existia.

            Neilson estava como queria: rodeado de “amigos”, mulheres e de toda sorte de vícios. Experimentou de tudo um pouco. Queria viver com a maior intensidade possível. Chegava a passar noites acordado “para não perder tempo com o sono”, era isso que dizia para os  amigos interesseiros. Todavia, sem se preocupar em investir em nenhum negócio e gastando “pra burro”, logo o dinheiro acabou. Também acabaram as mulheres, os amigos e a possibilidade de alimentar os seus vícios. Sem nada, começou fazer pequenos furtos e a apanhar da polícia. Com medo de morrer de tanta pancada, parou de roubar e passou a mendigar pelas ruas da cidade. Era expulso de vários estabelecimentos. Até mesmo de uma igreja foi colocado para fora, pois os “obreiros”, que somente introduziam no templo quem eles achavam “dignos”, diziam que “ali não era lugar de sujeira”.

        Um dia, sentado na sarjeta, pensou: Quantos trabalhadores de meu pai têm abundância de pão e eu aqui pereço de fome! (Lc 15:17 - RC). Então tomou a decisão que mudou completamente a sua vida: Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e perante ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus trabalhadores. (Lc 15:18-19 - RC). 

Assim, trabalhou alguns dias como catador de papel e de latinhas, arrumou o dinheiro da passagem e foi para casa. Seu pai, que ficava todos os dias desde sua partida praticamente o dia todo olhando pela janela e esperando a volta do filho, mal podia acreditar no que avistava ao longe: o seu caçula. Tão logo confirmou que era realmente ele, saiu correndo e o encontrou no caminho. O filho não conseguia olhar em seu rosto, embora chorasse muito, mas o pai ergueu a sua face e, chorando muito também, o abraçou fortemente e o beijou recebendo-o novamente em seu lar. As palavras planejadas foram ditas e o pai muito se alegrou do arrependimento do filho. Imediatamente, mandou que preparassem um banho e uma refeição caprichada para o jovem e anunciou aos empregados que organizassem uma festa para comemorarem o retorno do filho perdido.

            Entretanto, Otávio não gostou nada da notícia da volta do irmão e, ao chegar a casa depois de mais um dia de trabalho, chamou o pai a sós e disse:

_ ...Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com meus amigos; vindo porém, este teu filho, que desperdiçou os teus bens com as mulheres, mataste-lhe o bezerro cevado! (Lc 15:29-30 - RC).

            Ao que o pai respondeu:

_ ...Filho tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas; mas era justo alegrarmo-nos e folgarmos, porque este teu irmão estava morto, e reviveu, tinha-se perdido, e achou-se. (Lc 15:31-32 - RC).

            Otávio parou, pensou e disse:

            _ Ainda não consigo aceitar este meu irmão de volta. Quem sabe um dia, pai. Ore por mim.

            Os anos se passaram e os dois não se falavam. Bem que Neilson tentava, mas Otávio fugia do assunto. Nada que o irmão dissesse ou fizesse tinha valor para ele. Entendia seu irmão como um morto vivo: morto para ele, mas vivo para o seu pai. Até que numa noite em que não conseguia dormir, Otávio passou pelo quarto do irmão e ouviu, já que a porta estava entreaberta, a oração de Neilson por ele. As palavras eram mais ou menos essas:

            Querido Deus, peço que o Senhor toque no coração de meu irmão para que ele me perdoe. Eu sei que errei, mas já me arrependi. Faça com que ele entenda que o mais importante da vida cristã é o amor; e que não existe amor sem perdão e reconciliação. Acredito num milagre e confio no Senhor. Em nome de Jesus, amém!   

            Otávio ficou profundamente tocado pela oração e foi para o quarto chorar. Na manhã seguinte, um primeiro raio de sol brilhou na relação dos dois quando Otávio sentou-se à mesa para o café com o irmão e com o pai, o que não acontecia desde a chegada do irmão. Neilson ficou surpreso e feliz por dentro. Após o silêncio do café, o irmão mais velho dirigiu-se ao caçula da casa e chorando falou:

            _ Perdoa-me irmão! Eu fui um insensível e tolo ao não me alegrar com o seu retorno. Mas ontem eu passei pela porta do seu quarto, que estava entreaberta, e ouvi sua oração por mim. Não consegui dormir e passei a noite orando a Deus para que Ele também me perdoasse. Você me perdoa?

_Mas é claro que sim! É o que eu almejava todos esses anos após a minha chegada!

Ambos se abraçaram e o pai, emocionado, mas orgulhoso de seus filhos, também os abraçou. O abraço, os pedidos mútuos de perdão e mais o choro duraram uns quinze minutos e foi muito emocionante. Os dois filhos casaram-se no mesmo dia, foi uma festança na fazenda. Cada um teve três filhos e seu pai ainda conseguiu ver os netos. 




Reflexão:

Há muitos que todos os dias agem como o Neilson: deixam o seu lar paterno em busca de aventuras. Também há muitos agindo como Otávio: não aceitando o retorno daquele que um dia saiu de casa. Tanto os Neilsons quantos os Otávios da vida estão perdidos: um perdido fora da casa do Pai e o outro perdido dentro da casa do Pai. Um perdido por amar as paixões da carne e do o mundo, o outro perdido por amar sua posição e seu status no Reino. Um perdido por se achar pecador demais; o outro perdido por se achar santo demais. Um reconheceu o erro foi em busca do perdão; o outro orgulhoso demais para liberar o perdão e também reconhecer o seu erro.

A vantagem é que entre eles existia um pai amoroso e capaz de perdoar tanto um quanto o outro. Para Otávio, seu irmão estava morto, mas para o coração bondoso de seu velho pai, Neilson agora é que verdadeiramente estava vivo. É sempre assim: ainda que nossos irmãos, nossos pais, nossos filhos, nossos amigos ou até mesmo nosso cônjuge não nos considerem vivos, sempre estaremos “vivinhos da silva” para Deus, nosso Pai.

A parábola do Filho Perdido (Lc 15) é a mais comovente história contada pelo Mestre, pois retrata com muita propriedade a importância do poder do amor para perdoar e reconciliar o que antes parecia irreconciliável. No entanto, nem sempre praticamos a força do amor em nossas atitudes. Não podemos esquecer que no momento em que Neilson mais precisava de ajuda, nem mesmo uma igreja abriu as portas para ele. Não basta falar apenas sobre o amor. A mensagem mais convincente em relação ao amor é praticá-lo. Também não devemos esquecer que, aliado ao amor, operam juntas: a fé e a esperança. Logo, entendemos que para que a transformação de Neilson e de Otávio fosse completa, foi necessário que suas atitudes fossem cheias de: fé (crer que é possível mudar), esperança (acreditar que o melhor virá com a mudança) e amor (amar incondicionalmente); os três agindo em conjunto, só que, como o texto de I Co 13:13 e a história mesmo anunciam: o mais importante ainda é o amor.             


(Gilmar Cabral)




Nenhum comentário:

Postar um comentário